sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Do nada à lugar nenhum.

Dirigido por Felipe Joffily, a comédia Muita calma nessa hora tem um roteiro fraco, que leva o filme do nada à lugar nenhum. No percurso, algumas risadas. No final, a dúvida se elas valem o ingresso.

Trazer para o cinema elementos típicos da televisão não é novidade. Acostumado com o ritmo e o formato televisivo, o espectador acaba esperando o mesmo dos filmes. Cenas mais curtas, com mais cortes e dinamismo nos diálogos; enredos fáceis de serem acompanhados e personagens sem grande complexidade. É com isso que grande parte do público está acostumado a lidar, e é exatamente isso que Muita calma nessa hora apresenta.

Três amigas decidem passar um final de semana na praia. Cada uma busca fugir de um problema diferente: Mari (Gianne Albertoni) tem homens demais, Aninha (Fernanda Souza) é muito indecisa e Tita (Andréia Horta) acaba de ser traída por seu grande amor. Elas ainda encontram Estrela (Débora Lamm), garota hippie que está procurando o pai. Tem potencial pra render? Até tem, mas não rende. Nada grande acontece na vida delas. Não há epifania, não há um mísero momento lírico. Quando uma delas fala “quem diria que atravessar essa ponte ia mudar tanta coisa na nossa vida?” eu quase gritei no meio do cinema “mudou o quê?”. Mudou nada.

A vida depois da praia: uma marquinha de biquini a mais. E só.

O enredo se excede no número de personagens. A maioria deles apenas surge para protagonizar cenas cômicas sem propósito, como o “playboy” fã de Axé interpretado por Lúcio Mauro Filho. Perde-se tempo com personagens como esse enquanto as personagens principais, cujas vidas supostamente mudam tanto, continuam estagnadas. Esses personagens secundários compõem cenas que, juntas, parecem mais um especial de comédia da Globo, dividido em blocos, do que um filme.

É engraçado? Sim. É um filme leve e divertido? Também. Mas é raso. É como pagar um ingresso de cinema para assistir a três episódios seguidos de A diarista, ou Sexo frágil. (Eu sei que esses programas não existem mais, mas eu não conheço nenhum atual.) Mulherada, se forem assistir, levem todas as suas amigas. Vale conversar e rir durante a sessão, porque o filme é bonitinho e não exige muita atenção. E é isso.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Notinha sobre o Festival de Brasília.

Hoje começa o 43° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. A cerimônia de abertura e as demais apresentações do dia são restritas a convidados, mas a partir de amanhã a entrada é liberada.

São curtas, longas, 35mm, digitais, debates e seminários para ocupar cada minuto da semana inteira. As apresentações ocorrem em locais diferentes ao mesmo tempo, então fazer escolhas é um ato imperativo dentro do festival.

Eu já ouvi professores meus considerarem o festival de Brasília como decadente, mas eu nunca fui a nenhum, e sou meio como São Tomé, prefiro ver para crer. E a experiência de ver e não gostar é tão válida quanto a de ver e gostar. É um exercício ao senso crítico.

Programação completa em: http://www.festbrasilia.com.br/2010/

domingo, 21 de novembro de 2010

Dark, darker, darkest.

A saga cinematográfica de Harry Potter está chegando ao fim. O primeiro dos dois filmes em que a história do último livro foi dividida foi lançado nesta sexta, dia 19, no Brasil. Sob a direção de David Yates, o mesmo de A ordem da Fênix e O enigma do príncipe, com Harry Potter e as Relíquias da Morte a saga atinge seu ponto mais sombrio.

As evidências de que a vida de Harry estava passando de não muito fácil a muito difícil vinham sendo apresentadas ao público desde A ordem da Fênix. O tom sombrio foi acrescentado a seu universo em O prisioneiro de Azkaban, dirigido por Alfonso Cuarón,mas nos filmes conduzidos por Yates ele se confunde com o próprio ar que os personagens respiram. Enquanto que para os outros diretores a escuridão era apenas momentânea no mundo da magia, para Yates ela é um elemento principal. E isso faz toda a diferença.

Em As Relíquias da Morte, Harry parte em busca das Horcruxes que compõem a alma despedaçada de Voldemort, o bruxo das trevas mais temido do mundo mágico. O único modo de derrotá-lo é destruindo as Horcruxes, mas Harry logo percebe que não sabe muito bem como encontrá-las. A guerra entre os partidários de Voldemort e os aliados do falecido Dumbledore se acentua, tornando-se muito mais sangrenta.

Emma Watson, Rupert Grint e Daniel Hadcliffe como Hermione,Ron e Harry.

O fato de a história do último livro ter sido dividida em dois longas deu espaço para que mais acontecimentos da narrativa original fossem incluídos na versão para o cinema. Ou melhor, menos coisas precisaram ser cortadas para que o tempo de filme não ficasse comprido demais. Isso agrada muito aos fãs do livro, com certeza. Eu concordo com a teoria de que uma adaptação cinematográfica deve sobreviver independente da obra original, mas na prática não é muito fácil evitar as comparações. Mesmo com a satisfação de fã em ver o enredo do livro todo na tela, eu achei que algumas coisas passaram com demasiada rapidez. Além de que eu duvido seriamente que alguém que não conhece a história do livro entenda totalmente o filme. Essa velocidade toda talvez tenha a ver com uma proposta estética de dar agilidade ao filme, talvez seja apenas um meio de encaixar tudo em 2 horas e 40 minutos, não sei. Como fã, As Relíquias da Morte foi a melhor adaptação de Harry Potter que eu já vi. Como aspirante à crítica de cinema, ele perde para O enigma do Príncipe.

Essa parte da saga de Harry possui cenas particularmente pesadas, com as quais Emma Watson e Rupert Grint,interpretes de, respectivamente, Hermione Granger e Ron Weasley, lidam muito bem. Quanto a Daniel Radcliffe, que dá vida ao personagem título, bem, não me parece que todos esses anos de experiência como ator lhe tenham proporcionado alguma evolução. A única cena realmente boa que ele já fez foi a da poção Félix felicis em O enigma do príncipe. Ponto. Em Relíquias da Morte ele continua como em todos os outros filmes de Harry Potter: medíocre. Ralph Fiennes está ótimo como Voldemort. Minha opinião quanto a Helena Bonhan Carter como Bellatriz Black sempre oscila. Ainda não consegui decidir se gosto daquela interpretação de louca varrida ou se preferia uma personagem mais fria e calculista. De qualquer forma, acho que não deviam permitir que ela arrumasse o próprio cabelo antes de gravar.

Helena Bonhan Carter levando seu cabelo do dia a dia para a personagem. Será que ela interpreta ela mesma?

A direção de arte foi fiel ao clima sombrio da história do início ao fim. Até mesmo a praia em que fica o Chalé das Conchas, casa de Gui e Fleur Weasley, parece triste e sem vida. Os tons de cinza predominam no figurino, e as locações em que Harry acampa com seus amigos passam a sensação de solidão e impotência, sendo este último o sentimento contra o qual o garoto trava a sua pior batalha interna. Ele vê seus amigos mais queridos perderem a vida por acreditarem que ele tem o poder de vencer uma causa por eles. Harry, contudo, não sabe nem por onde começar. Esses sentimentos se transportam da tela para o público, e é impossível não se emocionar, principalmente com o desfecho.

David Yates fez, com certeza, o mais sombrio de todos os filmes de Harry Potter. Como adaptação, nunca vai agradar a todos, mas me arrisco a dizer que as duas partes de Relíquias da Morte ainda serão consagradas pela maioria dos fãs como seus filmes favoritos da série. Serão os dois mais emocionalmente envolventes, os que mais nos tirarão personagens queridos, mas os que proporcionarão as maiores redenções. Podem apostar.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um parto de viagem.

O estilo de Um parto de viagem (Due date) lembra muito Se beber, não case (The hangover), que foi, me arrisco a dizer, a comédia de maior sucesso de 2009. E não é à toa: apesar de não compartilharem os mesmo roteiristas, eles compartilham o mesmo diretor, Todd Phillips. As situações absurdas que marcaram Se beber, não case estão de volta em Um parto de viagem, mas não são, contudo, o principal fator em comum entre os dois filmes. Zach Galifianakis traz de volta pelo menos 90% de seu personagem no primeiro, Alan Garner, para compor o aspirante a ator Ethan Tremblay, no segundo.

Robert Downey Jr. e Zach Galifianakis em cena.

Apesar de já estar na carreira há muito tempo, Zach Galifianakis somente se tornou um ator vastamente conhecido e admirado com Se beber, não case, em que interpreta o cunhado destrambelhado e meio drogado do noivo que sai para Las Vegas em sua despedida de solteiro. O personagem não possui grandes habilidades de interação social, apesar de morrer de vontade de se enturmar. Em Um parto de viagem, ele dá vida a um aspirante a ator destrambelhado e meio drogado, que não possui o menor jeito para fazer e manter amizades. Parecido? Quase igual. E assim também é a interpretação de Zach.

Não quero dizer que Zach Galifianakis não é um bom ator. Sua interpretação é muito boa e rende ótimas risadas, mas se ele continuar fazendo sempre o mesmo papel, o risco de tornar-se cansativo é muito grande. Não sei se ele ainda se provará um ator versátil. É possível, mas eu duvido. E não será por falta de talento, mas por oportunidades. Como já se provou um excelente ator de comédia – principalmente como personagem excêntrico, a tendência é que seja chamado majoritariamente para esse tipo de papel. Grande parte da responsabilidade pela semelhança entre os personagens de Zach em Se beber, não case e Um parto de viagem é do diretor, comum aos dois filmes. Quanto a isso não há dúvidas. Ainda assim, temo que Zach não fará papéis muito diferentes desses, mesmo sob outro estilo de direção. Se essa minha hipótese se provar falsa, contudo, ficarei imensamente feliz.

Enfim, Um parto de viagem é muito engraçado. Alguns moralistas podem chiar com as cenas politicamente incorretas, como naquelas em que o personagem de Robert Downey Jr. bate em uma criança e cospe na cara de um cachorro, mas o politicamente incorreto também faz parte da vida. A propósito, Robert Downey Jr. está ótimo no filme. Percebe-se um quê de Homem de Ferro em seu personagem, o arquiteto Peter Highman, mas muito sutil. E é muito gostoso vê-lo em um filme de comédia. Se estiver afim de rir, assista.

domingo, 14 de novembro de 2010

Uma impostora involuntária.

Breakfast at Tiffany’s é o famoso filme que, em português, virou Bonequinha de luxo. A imagem de Audrey Hepburn de vestido preto, colar de pérolas e coque no cabelo fazendo biquinho com uma longa piteira em mãos tornou-se ícone da cultura pop. O que realmente acontece no filme, no entanto, nem todo mundo sabe. E muito menos o que está por trás de seu enredo.

Em 1958, Truman Capote publicou Breakfast at Tiffany’s, que no Brasil ficou sendo Ao começo do dia. Atualmente, devido ao sucesso da adaptação cinematográfica de 1961, é possível encontrar o livro como homônimo da tradução do filme, Bonequinha de Luxo. É um livro bem pequeno, que nos apresenta Holly Golightly exatamente como vemos no filme: alegre, despreocupada e meio destrambelhada. O que o cinema fez, contudo, foi suavizar os aspectos que indicam que Holly é, na verdade, uma garota de programa.

No filme, é revelado que ela sobrevive saindo para jantar com cavalheiros e pedindo cinqüenta dólares para ir ao toalete – mais cinqüenta para o táxi. Já no livro, ela faz as suas contas e revela já ter tido pelo menos onze amantes. Não que isso a torne menos graciosa e cativante. Truman Capote escreve tudo com leveza, e é impossível não se juntar ao grupo de apaixonados por Holly Golightly.

Quanto a sua relação com o homem que no filme é Paul Varjak (George Peppard), mas no livro é apenas chamado de Fred por Holly – a história é narrada em primeira pessoa por ele, há algumas diferenças. Fred escreve em seu relato estar apaixonado por Holly,mas nenhum romance realmente existe entre os dois, e é possível perceber que o sentimento do rapaz é de um amor mais fraternal. Já me disseram que ele era, na verdade, gay, mas eu não encontrei nenhuma evidência óbvia desse fato na ficção. No longa, Paul e Holly se apaixonam, e Hepburn e Peppard protagonizam uma das cenas românticas mais bonitas da história do cinema.

Garota de programa ou não, a graça e a leveza da personagem envolvem tanto a quem lê sobre ela quanto a quem assiste a brilhante interpretação de Hepburn. É impossível pensar em outra atriz que faria uma Holly Golightly tão perfeita. E com o tempo, Audrey e Holly tornaram-se quase a mesma pessoa. A imagem da atriz na pele da personagem se fixou tão fortemente na cultura pop que muitos a admiram sem nem ao menos conhecerem a sua história. O que não é difícil, pois é uma imagem que transmite glamour e luxo, e que, somada a tradução em português do título, só pode gerar interpretações equivocadas.

Audrey como Holly. Existe imagem mais glamurosa?

Tenho certeza de que a popularização da imagem de Audrey como Holly começou devido ao sucesso do filme. E perpetuou-se pelo estilo transgressor da personagem. No passado, admirar Holly Golightly era admirar um estilo de vida boêmio, alternativo, era levantar-se contra a moral familiar tradicional. Mas o tempo passou, a foto ficou e a história por trás dela, em grande parte, se perdeu. Hoje não passa de uma garota bonita com uma gargantilha de pérolas e aparência de rica e mimada.

Eu amo Holly Golightly. Tanto a Holly do livro quanto a Holly do filme, mas fico imaginando se as adolescentes que atualmente se dizem “bonequinhas de luxo” realmente gostariam de viver aquele estilo de vida, se sabem o que a personagem representa – ou deveria representar. A imagem desvinculada da história fez dela quase um mito, mas a admiração sem o véu da ignorância é sempre mais sincera. E as pessoas deveriam conhecer de verdade o que admiram.

domingo, 7 de novembro de 2010

Tarantino, Bastardos Inglórios e porquê Pulp Fiction é melhor.

Em 2009, poucos foram os seres humanos que foram ao cinema assistir Bastardos Inglórios e não saíram totalmente impressionados com o filme, exclamando entusiasmado o quão fantástico ele era. Pode-se dizer com grande segurança que Bastardos conquistou muitos fãs para o diretor Quentin Tarantino, sucesso que foi coroado com a posterior indicação a oito Oscars, incluindo melhor filme. A única estatueta, contudo, foi para o ator coadjuvante Christoph Waltz. E você sabe por que? É porque Bastardos Inglórios is not THAT big of a deal.

Sim, é claro que ver todos aqueles nazistas apanhando de judeus é uma experiência altamente catártica, mas o filme não vai muito além disso. Longe de mim querer criticar Tarantino, que é um dos meus diretores favoritos, e não estou dizendo que o filme é ruim, muito pelo contrário. Minha única intenção aqui é destacar o fato de que o filme é supervalorizado, porque Tarantino já fez sim, coisa muito melhor.

Brad Pitt tornando difícil separar o ator do personagem...

Pra começar, é de conhecimento geral que Tarantino adora homenagear outros diretores em seus filmes, e o escolhido da vez foi Sergio Leone. Esse diretor é famoso por seus filmes tipo “western spaghetti”, com longos planos gerais de paisagens, além da ênfase nos olhares das personagens, segurando a tensão ao máximo. A parte mais óbvia em que Tarantino segue esse estilo é na cena de abertura, em que o Coronel Landa visita o Sr. LaPadite. Nela, vê-se a comitiva alemã surgindo ao longe e se aproximando da casa, enquanto, pela expressão do proprietário, o espectador percebe que aquela visita não lhe será agradável. A cena do encontro dos Bastardos com a espiã alemã na tarverna é outro bom exemplo. A troca de olhares entre as personagens quando a situação fica tensa lembra muito a cena final de Três homens em conflito (The good, the bad and the ugly). Só que Leone conseguia fazer com que a combinação entre planos e trilha sonora gerasse um clima de tensão, enquanto que, em Bastardos, Tarantino às vezes erra a mão e deixa a coisa toda meio cansativa. MAS, você me diria, a trilha dos dois filmes foi composta pela mesma pessoa, Ennio Morricone. Então como pôde dar errado? Eu não sei. Só o que sei é que, em alguns momentos, deu. Em alguns momentos essa homenagem à Leone me parece mais uma falta de identidade própria de Tarantino. Devo confessar que a mistura de estilos entre “western spaghetti” e filme de II Guerra Mundial é uma idéia muito interessante, mas simplesmente não funciona o tempo todo.

... enquanto Christoph Waltz chega pra salvar o filme.

Outra questão é o elenco do filme. Christoph Waltz como Coronel Hans Landa é mais do que genial, mas Brad Pitt pode não ter sido a melhor das escolhas. Ele é famoso demais, e a atração de ver Brad Pitt com sotaque texano torna-se maior do que o envolvimento do público com um personagem tão pitoresco. Que, para falar a verdade, é do Tennessee.

Enfim, não estou dizendo – repito – que o filme é ruim. Só o que eu quero dizer é: parem de superestimá-lo! Pulp Fiction, por exemplo, é um filme muito melhor. Se você quer ser fã do Tarantino e idolatrá-lo por alguma coisa, que seja por Pulp Fiction, não por Bastardos. E o motivo é bem básico: em Pulp Fiction a personalidade do diretor marca forte presença em todas as cenas. O filme surpreende, você nunca sabe o que virá a seguir, nunca pode imaginar qual pensamento surreal sairá da boca de um daqueles personagens tão estranhos e ao mesmo tempo tão reais. John Travolta dançando com Uma Thurman e depois tendo conversas absurdas com Samuel L Jackson são cenas que valem mais do que qualquer coisa que acontece em Bastardos. Até mesmo a atuação de Christoph Waltz.

... mas nada disso supera a genialidade John e Uma botando pra quebrar em Pulp Fiction.