sábado, 2 de junho de 2012

25/05, dia de cinema brasileiro – parte 2



A sessão seguinte à Xica da Silva era Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho. Cineasta reconhecido, Coutinho é descrito pelo site oficial do festival como “o mais importante documentarista brasileiro”. Cabra Marcado retoma não somente a história do Brasil, mas também uma peça importante da carreira do próprio cineasta.

O Cabra Marcado original

Em 1962, foi assassinado o líder camponês João Pedro Teixeira, na Paraíba. O Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC da UNE) decidiu produzir um filme que reencenava a história de vida de João Pedro, de suas lutas até seu assassinato.

A família do camponês, constituída por sua viúva, Elizabeth Teixeira, e seus dez filhos, interpretariam seus próprios papéis. Outros amigos de João Pedro e participantes da liga camponesa fundada por ele também participariam do filme. Utilizando muitas falas criadas pelos atores/personagens e suas próprias casas como locação, o filme apresentava altíssima qualidade em termos de execução técnica, principalmente na fotografia executada sobre o negativo em preto-e-branco. Os poucos fragmentos que sobraram são inseridos por Coutinho no documentário atual.

O golpe militar de 1964 interrompeu as filmagens. Os membros da equipe, bem como Elizabeth Teixeira e sua família, foram perseguidos. O que se salvou do filme foi a parte que já havia sido mandada para a revelação no laboratório.

Vinte anos depois.

Em 1984, com a abertura do regime militar, Coutinho decide retomar Cabra Marcado para Morrer. Dessa vez, contudo, o filme se transformaria em um documentário sobre como e porque as filmagens foram interrompidas, e o que aconteceu com a família Teixeira.

Coutinho volta às antigas locações e procura os participantes do filme, mostrando-lhes as antigas imagens de que participaram e lhes entrevistando sobre o que se lembram da realização do filme e sobre o que pensam em relação ao trabalho que realizaram.

Elizabeth Teixeira e sua família durante as filmagens de 1962-64.

Ao relembrar a história do movimento camponês, o documentário mostra a consciência política e de classe que esses trabalhadores possuem.  Também é reconstituída a história de João Pedro e sua família. Elizabeth Teixeira, que havia mudado seu nome e se escondido, se revela novamente a parentes e amigos. Dessa forma, além de recordar a perseguição política da década de 1960, Cabra Marcado também registra o afrouxamento do regime militar na década de 1980.

O cinema como arma.

Apesar de contar uma história de muito sofrimento e tristeza, o filme também arranca algumas risadas ao descrever a perseguição dos militares aos estudantes que realizavam o filme de 1962. Ao interrogarem os camponeses, havia uma pergunta freqüente: “como eram esses cubanos que estavam aqui?”.

Isso mesmo, um grupo de estudantes que fazia um filme foi confundido com cubanos que tentavam instaurar uma revolução no país. Perguntavam ainda como os “cubanos” falavam, se os camponeses eram capazes de entendê-los, e o mais importante: onde estavam as armas? No lugar onde se imaginava que mais de 20 mil armas estavam sendo escondidas, o exército encontrou apenas tripés, refletores, câmeras, rolos de filme, enfim, um equipamento básico de filmagem.

Pela inquietação e perseguição que as filmagens de Cabra Marcado para Morrer gerou em 1962-64, e por tudo o que a versão final de 1984 demonstrou, fica claro que o cinema pode sim, ser uma arma muito poderosa. 

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