Os créditos de abertura explicam
o contexto histórico do livro. Na França de finais do século XVIII, o convento
era o destino de muitas jovens sem vocação. Enviadas pelos pais seja para
manterem-se virgens até o casamento, seja para não serem uma despesa a mais na
casa, as moças não tinham controle algum de seu destino.
A entrada no convento e a resignação.
Suzanne (Anna Karina) é a mais
nova de três irmãs. Com as duas mais velhas já casadas, o pai se recusa a
gastar dinheiro com o casamento da caçula, e a manda para o convento. A mãe de
Suzanne, Madame Simonin (Christiane Lénier), revela a filha que seu pai
verdadeiro não é o marido, sendo ela fruto do pecado do adultério. Assim, a mãe
lhe pede que a filha “ajude-a a expiar seu pecado”, tornando-se uma boa freira.
A jovem ainda é alertada de que não tem direito a herança e que as irmãs não
lhe darão nada, pois já são casadas e tem seus próprios filhos para cuidar.
Apesar da já conhecida falta de
liberdade das mulheres na época, o egoísmo demonstrado por aqueles que mandam
Suzanne para o convento é impressionante. O pai só pensa nas despesas que a
filha gera e a mãe a vê como bode expiatório para seu pecado. Na primeira vez
que vai proclamar seus votos, Suzanne grita a todos que está ali contra a sua
vontade e volta para a casa, mas, sem escolha, acaba mandada novamente para o
convento.
Suzanne se prepara para proclamar seus votos. |
A primeira Madre Superiora que a
recebe é gentil como uma mãe. A consola de uma maneira bastante melodramática e
a apóia até a confirmação de seus votos. Resignada, Suzanne passa de noviça à
freira, mas afirma não ter lembrança alguma da cerimônia, não tendo agido de
livre e espontânea vontade.
As provações de Suzanne
A obrigação de tornar-se freira
contra a sua vontade não é a única dificuldade que Suzanne enfrenta. As
injustiças que sofre representam as críticas de Diderot à Igreja Católica, mas
também podem ser interpretadas como uma crítica à configuração de uma sociedade
em que a mulheres sem meios financeiros estão à mercê dos mais fortes.
Após a morte da primeira, uma
nova Madre Superiora assume o posto. Ao contrário de amor maternal, a sucessora
dispensa a Suzanne apenas antipatia. Assim que encontra um motivo, ela utiliza
seus poderes de forma abusiva para humilhar a subordinada. O primeiro “crime”
de Suzanne é o de manter uma bíblia pessoal escondida no quarto, o segundo, é a
contratação de um advogado para pedir a anulação de seus votos. Por isso, ela é privada de roupas limpas, de
um quarto mobiliado e até mesmo de comida e água. Enfraquecida, suas súplicas
quase delirantes por comida são interpretadas como possessão pelo demônio.
É clara a crítica ao fanatismo
religioso e ao próprio sistema hierárquico da Igreja, que isolava seus membros
e permitia que abusos continuassem até que um julgamento fosse realizado. Um
exemplo claro e indignante é a afirmação do advogado de Suzanne de que ele sabe
– e não tem como evitar – dos maus-tratos que a jovem sofre nas mãos das
companheiras.
Presa no convento contra a sua vontade, Suzanne luta pela liberdade. |
Após ser absolvida das acusações
de descumprimento das regras do convento, Suzanne tem a anulação dos votos
negada, mas lhe é permitido que mude de ordem. Ela é recebida com alegria e curiosidade
pelas novas irmãs, sobretudo pela Madre Superiora. O clima no novo convento é
exatamente oposto ao anterior: em lugar de simplicidade e austeridade, as
freiras riem como adolescentes e gozam de certos luxos, ostentando inclusive
jóias. A principal incentivadora do comportamento relapso das irmãs é a Madre
Superiora, que passa a assediar Suzanne. Sem poder agüentar mais, ela foge do
convento, apenas para descobrir que o mundo do lado de fora, aquele que tanto
sonhou em conhecer, não é nada acolhedor.
As críticas de Diderot .
As críticas elaboradas pelo autor
e transmitidas pelo filme muitas. Críticas à Suzanne, que é a representação da
mulher da época, sem estudo, ingênua e ignorante, incapaz de sobreviver no
mundo sem a tutela dos pais, do marido ou das irmãs do convento. À sociedade da época, que tratava essas
mulheres como objeto e não lhes dava o menor espaço. Por fim, sua crítica mais
forte é ao sistema de claustro a que estão submetidas às mulheres no convento. Praticamente
excluídas de qualquer contato externo, muitas delas sem vocação, seus
pensamentos e ações variam do fanatismo religioso ao desejo lésbico.
Apesar de tudo isso, não se
percebe um ataque direto à fé, mas sim ao que os homens fazem dela: instrumento,
desculpa, justificativa para os piores atos.