sexta-feira, 15 de julho de 2011

Tudo termina.

A mais famosa saga cinematográfica de todos os tempos chegou ao fim. Fãs do mundo inteiro lotaram os cinemas na pré-estréia da meia-noite, uma cena que com certeza se repetirá durante todo o final-de-semana. Não há como negar que Harry Potter influenciou a toda uma geração. A fez rir, torcer, se emocionar, chorar de tristeza e de felicidade, se encantar... sonhar. Não posso negar que faço parte dessa geração que cresceu com Harry e que deve aos livros de Joanne Kathleen Rowling a vivência de belos e inesquecíveis momentos.

Sim, tenho várias ressalvas em relação a Relíquais da Morte parte II como fã, sendo a principal delas a duração curta do filme, mas prometo deixar as reclamações de fã de lado, já que este texto é, afinal, sobre cinema. Relíquias da Morte parte I já havia trazido à saga elementos cinematográficos muito mais sofisticados do que a rigidez hollywoodiana dos primeiros filmes, e isso é algo que a parte II não apenas continua, mas amplifica e intensifica – e nisso consiste seu grande mérito.

Harry, Rony e Hermione enfrentam sua última e mais difícil batalha.

O filme começa exatamente no ponto em que o anterior termina: Voldemort (Ralph Fiennes), tendo violado o túmulo de Dumbledore (Michael Gambon), apodera-se da Varinha das Varinhas, enquanto Harry (Daniel Hadcliffe) enterra Dobby (Toby Jones) nas proximidades do Chalé das Conchas. Quem esperava um flashback para dar uma refrescada na memória ficou desapontado. Essa, inclusive, é uma característica dos filmes da saga dirigidos por David Yates: ele não perde tempo com muitas explicações, o que me faz pensar que a parcela do público que não conhece os livros talvez não entenda tudo. Após se despedir de Dobby, Harry parte com Rony (Rupert Grint) e Hermione (Emma Watson) para o banco bruxo Gringotes, em busca de mais uma horcrux.

Hermione se transfigura em Bellatriz Lestrange, cena em que Helena Bonha Carter arranca risadas como a Hermione delicada e educada tentando agir como a bruxa arrogante e má que é Bellatriz. Após enfrentarem um tesouro que se multiplica, um dragão e uma dúzia de guardas, – que apesar dos costumes bruxos de usar capas, vestem-se com estranhos uniformes azuis de guardas de museu - Harry e seus amigos fogem montados no já mencionado dragão. Assim que pousam, eles decidem ir a Hogwarts.

Para não entrar em muitos detalhes sobre o enredo, Voldemort organiza um ataque à escola e logo os preparativos para a batalha começam. Aqui, o único comentário de fã que farei (juro): não achei compatível com a personagem da professora Minerva Mcgonagall (Maggie Smith) mandar os alunos da Sonserina para às masmorras na eminência de um ataque ao castelo. McGonagall, tanto nos livros quanto nos filmes, sempre colocou o bem-estar dos alunos em primeiro lugar, fossem quem fossem. Nesse ponto do filme, uma frase que comandasse os menores de idade a saírem em segurança e os maiores a escolher: sair, ou ficar e lutar, seria ao mesmo tempo mais adequada a personagem e seria um melhor indicativo do começo dos preparativos para a batalha.

McGonagall reforça as proteções de Hogwarts.

O exército de Voldemort se alinha em frente aos portões, e é imenso. Os defensores de Hogwarts são poucos, mas dedicados – e isso é o que conta mais, como destaca Arthur Weasley (Mark Williams). A batalha toma quase todo o tempo do filme, e os intervalos em meio à ação são tristes, marcados pela morte de personagens queridos e grandes descobertas por parte de Harry.

Relíquias da Morte parte II segue o tom sombrio da primeira parte. A fotografia é escura e os ambientes cinzentos. O 3D foi feito a partir da versão original em 2D, o que apresenta vantagens e desvantagens. A vantagem é que, não sendo um filme feito especialmente para ser exibido em 3D (além de ter sido pensado por um diretor maduro), não há efeitos de coisas saltando da tela em direção ao espectador a todo o tempo. A desvantagem é que o 3D escurece ainda mais a fotografia e gera o desconforto visual de “perder” as laterais da imagem, já bem conhecido do público que assiste a filmes com essa tecnologia. O grande mérito do diretor, David Yates, é inovar nos ângulos e movimentos de câmera. O plano detalhe dos olhos de Neville (Matthew Lewis) que vem logo após um plano médio de Hermione é particularmente interessante.

Harry enfrenta Voldemort pela última vez.

A leveza dos primeiros filmes é apagada de vez. A magia do desfecho de Harry Potter é escura e cruel, mas nunca sem esperança. Yates, contudo, imprime na tela imagens belíssimas, mesmo quando sombrias. O diretor transformou o que era uma bonita história infantil em A pedra filosofal em Cinema. Um êxito memorável, independente de qualquer chiação por parte dos fãs.

Não se pode falar de Relíquias da Morte parte II, contudo, sem dar o devido destaque ao personagem Severus Snape e a brilhante atuação de Alan Rickman. É ponto comum entre os críticos de cinema, tendo lido o livro ou não, que Snape revela-se como o personagem mais complexo de toda a série nesse último longa. Sim, Snape é isso e muito mais: é o personagem sem o qual nada teria sido possível, é o personagem que revela o cerne da história de Rowling: o amor como a força mais poderosa que existe. Mesmo antes de a verdade ser revelada, Rickman dá pistas da verdadeira natureza de Snape em sua atuação. Sua relutância em pedir aos alunos que entreguem Harry e seu receio de machucar McGonagall ao duelar com ela são indícios explícitos, apesar de sutis. Um paradoxo que o talento de Rickman torna possível.

Alan Rickman como Snape: o personagem mais surpreendente da série se revela.


Dez anos depois, a saga chega ao fim. Mais do que uma adaptação de oportunidade para atingir altos índices de bilheteria, porém, Harry Potter firmou-se como uma gigantesca realização cinematográfica. Uma história redonda, com personagens ricos e complexos, dentro de um universo cheio de detalhes e situações mirabolantes, mas verossímil, realizado sob as diferentes visões de quatro diretores e com os melhores recursos técnicos disponíveis. É esse conjunto, e não apenas o fervor dos fãs, que vai garantir que a história do menino que sobreviveu viva ainda por muitas décadas mais.

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